terça-feira, 17 de abril de 2012

LIBERDADE RELIGIOSA NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL


 Por Leonardo Augusto Moreira da Silva
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Introdução:
A liberdade, sempre foi uma busca do ser humano. Do latim, libertas, significa condição de homem livre. Prerrogativa amplamente assegurada pela Constituição Federal brasileira, em seu artigo 5º, incisos XVII; XLVI e LIV.
Na época dos Estados absolutistas, ou seja, por volta do século XV, aproximadamente, as pessoas não tinham a liberdade que vemos hoje: a liberdade de escolher sua religião; em quem votar; de ir e vir, tudo isso era limitado ao querer de um rei, por este deter o direito divino de governar, como se dizia na época.
Com a queda da Bastilha, no século XVII, início da Revolução Francesa, o rei Luis XVI foi decepado, dando lugar a uma maior liberdade aos cidadãos parisienses, um marco inicial para a liberdade que temos hoje. Dando um salto histórico...
Mas mesmo assim, a liberdade religiosa ficou por um tempo estagnada como vemos no artigo 5º da Constituição de 1824:
“Os Conselheiros, antes de tomarem posse, prestarão juramento nas mãos do Imperador de manter a religião católica, apostólica, romana, observar a Constituição e as leis, ser fiéis ao Imperador, aconselhá-lo segundo suas consciências, atendendo somente ao bem da Nação”
Nesta época não havia liberdade religiosa, como nos é dado perceber a partir do texto constitucional, afinal, por exemplo, os africanos que eram trazidos ao Brasil a fim de terem sua mão de obra explorada eram obrigados a aceitarem a religião católica, sendo que o catecismo, dado pelos padres jesuítas, muitas vezes, se resumia a ensinar uma Ave Maria, aos “novos católicos”. Sem entrar aqui no mérito da catequização dos índios.
Ora, assim, os africanos começaram a arrumar um jeito para continuarem com a prática de sua religião, qual seja, o candomblé. Cada um dos 16 orixás – entidades cultuadas no candomblé e na umbanda – corresponde a um ou mais santos católicos. Por causa desta proibição os escravos começaram a associar suas divindades com os santos católicos para exercerem sua fé disfarçadamente.
Como são muitos os santos católicos, existem divindades que são identificadas por mais de um santo, por exemplo, Oxóssi, o rei da caça, é associado a São Jorge e a São Sebastião.
Alguns exemplos:
Iemanjá: Nossa Senhora da Conceição
Iansã: Santa Bárbara: deusa dos raios, dos ventos, etc...
Xangô: São Jeronimo e São João
Ogum: Santo Antonio e São Jorge
Dentre tantos outros.
Bom, só faltou falar um pouquinho da relação dos orixás com a umbanda, uma religião genuinamente brasileira, surgida na década de 30, no Rio de Janeiro, a partir de elementos do candomblé, catolicismo e do espiritismo.
A questão da laicidade.
O que é um Estado laico? Ora, o laicismo defende a separação do Estado com a igreja, seja ela qual for. Os valores empregados pelo Estado laico é a liberdade de consciência e a liberdade religiosa. Esta necessidade brotou naqueles Estados em que a igreja influenciava totalmente na política, daí derivando as “guerras santas”, tal como, a inquisição.
Sempre devemos ter em mente que Estado laico não se confunde com Estado ateu, ou seja, aquele que não acredita em nada, tanto é verdade que no preâmbulo[1] da nossa CF, temos a invocação de Deus. Pensando no conceito de laico, respondamos a estas perguntas:
E hoje como definimos a liberdade religiosa? Será que, ao querermos ter nossa liberdade de credo respeitada, respeitamos a liberdade de credo do outro? Ou até no aspecto religioso, somos egoístas?
Ao adentrar em um prédio público, em um Fórum, por exemplo, no Plenário do Júri, nos deparamos com um crucifixo, para os que não adoram imagens aquele objeto será uma afronta a sua fé, pergunto, antes de pensarmos na esfera religiosa, quem sabe o significado daquele crucifixo, em um plenário do júri[2]?
Respondida a questão. A partir daqui vemos que a nossa visão, com relação à religião do outro, é muita vezes limitada, queremos respeito a nossa, mas a do outro é sempre inferior, com esta visão, que também é adotado por católicos, espíritas, etc...nunca chegaremos a um consenso, sempre havendo desavenças entre um e outro.
Constituição vigente
Por ora, analisaremos o artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal de 1988, que dispõe:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
  
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias (grifo nosso)
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A regra acima, nos dizeres de José Afonso da Silva, é:
“Trata-se de uma regra de garantia. Aí, o sentido “a” tem a função normativa de indicar o sentido universal pretérito do objeto determinado: a liberdade. A Constituição reconhece a existência do direito pela declaração de sua inviolabilidade. “Inviolável” com o artigo definido do seu objeto, aí, é um signo que denota o valor universal absoluto da liberdade de consciência e de crença” (SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 1ª ed. São Paulo, 2005, p. 93)
Nossa Constituição salvaguardou, com esta norma, o nosso direito de crença. Mister ressaltar que, como afirmado acima, quase todas cartas constitucionais anteriores, impunham a religião católica apostólica romana como oficial.
Hoje, graças a esta norma, há uma irradiação por todo o sistema jurídico brasileiro de garantias, dentre elas, a liberdade de crença, a liberdade de culto (ou seja, sua exteriorização através dos ritos, no culto, cerimônias, etc) e a liberdade de organização religiosa: relação Estado/Igreja.
Enquanto membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia deveríamos encontrar, no plano jurídico, óbice para a guarda do sábado, porém, não é isto que vem acontecendo em nosso Estado brasileiro. Senão vejamos:
“Uma aluna do curso de contabilidade, guardadora dos sábados, estava enfrentando dificuldades em ter sua aprovação, visto o número de faltas, nas sextas-feiras. Seu professor, então Deputado Federal, encaminhou um oficio a Secretaria de Estado de Educação, pedindo a solução, que foi resolvido sem delongas. Em meados de setembro de 2008 o Sr. Gerson Miranda, membro da Igreja Adventista do Sétimo Dia, cursava as aulas do SENAI, no período noturno e que em função de sua religião estava impedido de frequentar as aulas às sextas-feiras.
Em função disso, estava tendo problemas perante a Instituição de Ensino, já que não obtinha autorização para freqüentar essas mesmas aulas em dias e/ou horários alternativos, ele conseguiu autorização para cursar a aula de sexta-feira em outro dia e horário e pôde continuar seu curso sem maiores percalços. No dia 25 de Outubro de 2009 entrou em contato com a ONG Liberdade Religiosa, Alexander Arthur Juyumaya aluno da rede pública guardador do sábado com problemas por causa da reposição das aulas perdidas por causa da gripe suína, reposição essa que se daria aos sábados. A ONG Liberdade Religiosa o orientou e enviou a ele requerimento a ser protocolado na Escola. O requerimento foi deferido no mês de Setembro de 2009, possibilitando a ele, repor as aulas em dias alternativos”.
A questão do sábado vem sendo duramente questionada diante de nossos tribunais. Afinal de contas, como trabalhado acima, desde 1891, somos um Estado laico. E laicidade não permite a interferência de nenhuma religião no Estado.
Mas os adventistas do sétimo dia vêm travando uma batalha para que o sábado seja reconhecido como dia semanal de descanso e, principalmente, adoração. Mas uma coisa que devemos ter em mente é a de que: não vivemos em uma ilha. Mas sim, em um Estado Democrático de Direito, em que as diversidades são amplamente respeitadas, assim os membros da IASD são uma minoria, vivendo com católicos, protestantes, espíritas, umbandistas, budistas, etc. Se elevarmos o sábado como dia semanal de descanso e adoração, como fica os membros de outras denominações? Se queremos ter o sábado respeitado, não deveríamos partir de nós o respeito por eles?
O domingo vem sendo guardado por muitos cristãos ao longo de, aproximadamente, 2000 anos. O movimento adventista tem 250 anos, a disparidade de datas é grande, então como diz o ditado popular: “vamos devagar que o andor é de barro.”
Respeito ao ateísmo
Não intenciono aqui em esgotar o ateísmo, afinal, é um tema de grandes e construtivos debates. A liberdade assegurada por um Estado Democrático de Direito, ou seja, aquele em que as pessoas têm suas mais variadas formas de liberdade assegurada, dentre elas, a religiosa.
Ora, como cogitarmos um Estado em que queremos nossa liberdade assegurada, mas que não respeita a liberdade daquele que não que acreditar em nada?
Por isso, devemos respeito aos que não querem acreditar em nada, obviamente que, orando e pedindo para que o Espírito Santo toque nessas pessoas.

Conclusão
Do exposto, concluímos que, no plano jurídico, logo, no social houve uma grande evolução pela liberdade religiosa no Brasil. Mas é bom observar que, há muito a ser conquistado.
 
 
 
Leonardo Augusto Moreira da Silva
Pós Graduando em Direito Processual Civil. Bacharel em Direito pelo Centro UNISAL. Ex-Diretor Cultural do Centro Acadêmico “Luiz Rebello”. Trabalha no Ministério Público do Estado de São Paulo. Autor de vários artigos científicos, dentre eles, “A liberdade no Estado Democrático de Direito[4]” e “Evolução Histórica do Ministério Público[3]”. Membro da Igreja Adventista do Sétimo Dia de Olaria – Lorena, SP.


[1] Proclamação mais ou menos solene, mais ou menos significante, anteposta ao articulado constitucional, não é componente necessário de qualquer Constituição, mas tão-somente um elemento natural das Constituições feitas em momento de ruptura histórica ou de grande transformação política social (Estudos sobre a Constituição, p17).
[2] O crucifixo nestes ambientes nos faz ter cautela para analisar um processo, afinal, a crucificação de Jesus foi uma das maiores injustiças realizadas pelo homem, pois ele foi julgado e condenado sem o devido processo legal.
 

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